Entrevista com Manuel Castro e Brito, da organização da 29ª Ovibeja
09/04/2012
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“A classe política não preza quem produz”
A menos de três semanas do início da 29ª OVIBEJA o número de expositores “aumentou” em relação ao ano passado. As expectativas para a Feira são, por isso, “as melhores”, considera Manuel Castro e Brito, presidente da Comissão Organizadora da Feira e da ACOS- Agricultores do Sul, entidade que desde a primeira hora põe de pé a OVIBEJA, que este ano decorre entre 27 de Abril e 1 de Maio, no Parque de Feiras e Exposições de Beja.
Para Castro e Brito, apesar da “crise” e da seca que afecta o mundo rural, é necessário apostar na agricultura e na produção nacional, um sector que se tem vindo a modernizar e que hoje “não é o mesmo “ do que era quando se realizou a primeira OVIBEJA, sobretudo devido à “água de Alqueva”, e também a modernização e ao conhecimento de todos os sectores desde a agricultura à pecuária.
Num balaço sobre a actuação da ministra da Agricultura, o presidente da ACOS, considera que o facto de estar à frente de um superministério “não tem ajudado” Assunção Cristas.
Está aí à porta mais uma OVIBEJA. Que motivos de atracção tem esta edição? Mantém as características habituais de uma feira generalista, apostada em mostrar as vivências do mundo rural?
Alguém disse que a OVIBEJA era todo o Alentejo deste mundo e isso é uma realidade. Mas a feira tem evoluído e hoje já ultrapassa largamente as fronteiras do Alentejo. Quem vier à OVIBEJA depara-se com uma feira de âmbito geral, com uma grande diversidade, embora as actividades ligadas ao campo, à agricultura e ao interior do país tenham uma grande expressividade. Há também muitas pessoas que visitam a OVIBEJA por uma questão de regresso às origens, já que aqui existe esse contacto com os animais e com as actividades ligadas ao mundo rural. Mas a OVIBEJA não se esgota nisso: é também um espaço de inovação e de mostra de produtos cada vez mais elaborados, como o azeite, o vinho ou mesmo os cereais ou a pecuária. Há toda uma envolvência que começa no campo e que termina na gastronomia, nos restaurantes, na animação nocturna, que desde sempre constituem fortes atractivos para quem visita a feira.
Mas o mundo rural não é algo estanque, petrificado no tempo. De que forma a OVIBEJA tem acompanhado esta evolução?
A actividade de produção de alimentos e de preservação do ambiente é uma área que se tem desenvolvido muito, nomeadamente com a Política Agrícola Comum que tem dado possibilidade a grandes investimentos no mundo rural. O campo de hoje não é o mesmo de há 29 anos atrás quando foi a primeira OVIBEJA. Há muita gente nova envolvida no chamado “agrobusiness” e também há uma enorme quantidade de novas tecnologias que são aplicadas a este sector. Dito isto é preciso também dizer que em Portugal, no geral, o campo foi descurado e o nosso país dedicou-se mais à especulação financeira e a um consumismo global e uniformizado, em que todas as pessoas vestem de igual, têm os mesmos hábitos e os mesmos centros de interesse, que deu no que deu, destruindo a nossa economia e a de outros países do sul da Europa.
A grande “fábrica”, a grande indústria do Alentejo, continua a ser a agricultura?
A agricultura continua a ter um peso importantíssimo na nossa economia. Produzimos 70% dos produtos agrícolas que consumimos. Quanto mais produzirmos menos importamos e há produções que exportamos, o que é um grande contributo para o nosso país, isto apesar do sector da distribuição continuar a maltratar os produtores. A nosso ver, também a classe política não preza quem produz e faz um mau serviço não olhando para a produção nacional.
Parar Alqueva é um erro histórico
A OVIBEJA tem sido, nos últimos anos, um espaço de alerta para a forma como as grandes cadeias de distribuição nacional “esmagam”, ao nível dos preços e dos prazos de pagamentos, os agricultores. Tem havido algumas melhorias neste relacionamento entre a produção e a grande distribuição?
Têm existido alterações mínimas, mas temos que continuar a insistir neste problema porque existe um monopólio, de facto, ao nível da distribuição que prejudica muito os produtores. É algo que não faz sentido porque olhando os lucros brutais de dois ou três distribuidores –e não existem mais do que isso – se vê que há alguma coisa a fazer, principalmente em produtos excelentes que temos, como o azeite e o vinho, que a distribuição utiliza apenas como reclame para vender outros produtos que nada têm a ver com a nossa agricultura nem com a nossa produção.
O regadio de Alqueva, apesar de não estar ainda concluído, já está a mudar o Alentejo, tornando-o mais verde, produtivo e diversificado em termos de culturas agrícolas?
Sem dúvida. Há uma grande progressão e uma grande inovação e também um brutal investimento por parte dos agricultores na agricultura de regadio. Assistimos agora a um recuar deste governo no que diz respeito ao regadio do Alqueva que nos traz imensas preocupações, principalmente àqueles que já investiram e que continuam à espera de água. A conclusão da obra está a atrasar-se e pode pôr mesmo em causa o futuro do regadio de Alqueva. Penso que este é um erro histórico deste governo que anuncia “+ produção”, mas em países como o nosso não há mais produção se não houver água.
Ainda falta um grande investimento para concluir o regadio de Alqueva?
A contrapartida nacional representa à volta de 200 milhões de euros o que é ridículo face às notícias que todos os dias ouvimos de que, foram e vão ser disponibilizados milhões e milhões para os bancos. Estamos a investir em dinheiro improdutivo e o investimento produtivo é deixado para trás com este governo que, aliás, fez campanha eleitoral baseada na agricultura. Penso que aquilo que estamos a assistir é a uma deslealdade.
Este ano está a viver-se um ano de seca. Como é que os agricultores estão a reagir?
A seca deste ano é uma desolação. No sul do país temos um historial de secas, mas a deste ano assola todo o país, a vizinha Espanha e algumas regiões do sul de França e, de facto, estamos a gastar todas as reservas que tínhamos e isso configura um prejuízo enormíssimo para os agricultores e para a actividade económica de todas estas regiões.
Vamos importar mais alimentos
Portugal importa 30% dos alimentos que consome. Este ano, devido à seca, ainda vai ser mais.
Será mais, uma vez que vamos diminuir muito a nossa produção e nalguns sítios poderá mesmo não haver qualquer tipo de produção.
Têm sido avançadas pelo Governo algumas medidas para minorar os efeitos da seca. Do ponto de vista dos agricultores estas medidas são suficientes?
Curiosamente não consigo entender quais as medidas que vão haver para a seca. O que é anunciado é que se irá antecipar algumas ajudas, mas isso não é uma medida eficaz porque é agora que precisamos de apoios, uma vez que a banca não financia este sector e as taxas de juro, quando se conseguem empréstimos, são elevadíssimas. São necessárias medidas de crédito a longo prazo para este sector.
E de que forma a crise está a afectar a agricultura? Tem a ver, sobretudo, com a dificuldade de financiamento por parte da banca?
As empresas agrícolas, grandes ou pequenas, têm os mesmos problemas que as outras empresas, acrescido do problema da meteorologia e isso nota-se bem, este ano, com a seca. Por isso, também não se compreende que haja linhas de crédito para as empresas em geral e não haja linhas de crédito para a agricultura. Essa, também, é outra injustiça que é feita por este governo.
Voltemos à OVIBEJA. Neste quadro de crise que expectativas existem este ano para a OVIBEJA. A feira pode ser afectada em número de expositores ou de visitantes?
Curiosamente temos mais inscrições de expositores do que no ano passado. Quanto aos visitantes achamos também que a afluência de pessoas se irá manter. Em chegando a hora estamos convencidos que quem nos tem visitado continuará a vir “marcar o ponto” à OVIBEJA. Os preços de bilheteira há vários anos que não são aumentados e este ano também não o serão. Por outro lado, a OVIBEJA apresenta um programa diversificado e um cartaz de espectáculos de grande qualidade que vai agradar a vários públicos pelo simples preço de um bilhete de entrada na feira.
Este ano, mais uma vez, o azeite e o vinho vão estar em destaque na OVIBEJA, cujo lema é “+ produção”.
São dois grandes produtos do Alentejo, são dois grandes sectores onde houve dos maiores investimentos de todos os tempos na agricultura e são também aqueles que têm maiores hipóteses de exportação. Claro que os outros sectores não estão esquecidos e vamos também tratar de áreas como a agricultura em extensivo, o ambiente ou a produção de gado, que foi o início desta feira.
A OVIBEJA “nunca falhou”
A expectativa, portanto, é a de uma OVIBEJA dentro daquilo que tem sido normal, em termos de expositores e de visitantes?
Sim. Em termos de visitantes, de negócio, de divertimento, de contacto em termos das pessoas, a OVIBEJA nunca falhou e este ano também não vai falhar.
A OVIBEJA tem-se transformado também, ao longo dos anos, num verdadeiro fórum, quer da agricultura, quer do interior e do mundo rural, seja ao nível de propostas políticas, seja atraindo até ao Alentejo muitos elementos da classe política. Isto tem sido positivo quer para a OVIBEJA, quer para a região?
Julgo que esse facto tem sido muito importante por diversas razões. Em primeiro lugar dá visibilidade à feira. Depois acho que é importante para a classe política contactarem com uma realidade a que não está muito habituada, que é o caso do interior e do mundo rural. Isso tem acontecido e a organização da OVIBEJA agradece essa possibilidade.
Desde Junho passado a agricultura tem um novo responsável. Desta vez uma ministra que está à frente de um superministério, que vai da agricultura ao ambiente. Assunção Cristas tem estado à altura do desafio?
Ao falar-se de um superministério já está o balanço feito. São muitas pastas e, na minha opinião pessoal, a pasta da Agricultura é complexa e é muitíssimo importante, principalmente em momentos como este em que precisamos que haja mais produção nacional para importarmos menos e haver um maior equilíbrio da balança de pagamentos.
Gabinete de Imprensa da 29ª OVIBEJA